Você está aqui:Home » Dicas » Estudantes » Resumo de livro: Viva o Povo Brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro

Resumo de livro: Viva o Povo Brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro

Olá, leitor(a)!

Viva o Povo Brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro, publicado pela primeira vez em 1984, é um livro que aborda a constituição da identidade brasileira. O autor apresenta todos os elementos da formação cultural do país, desde os povos indígenas aos europeus e africanos. Para isso, ele faz descrições ambíguas, que não deixam claro o limite entre o real e o paródico, o mundano e o sobrenatural, o factível e o sonho.

Além disso, contrapõe a história dos vencedores (registrada nos livros e nas certidões) com a dos vencidos (transmitida pela oralidade). Com uma narrativa, muitas vezes, poética, Ubaldo Ribeiro deixa a cargo do leitor interpretar o que realmente aconteceu. O romance, focado no Recôncavo baiano, percorre quase quatro séculos de história, destacando, sobretudo, o século XIX.

A obra aponta a natureza cíclica da história, bem como a projeção dos acontecimentos no âmbito pessoal para o âmbito coletivo de um povo. É a história de todo o Brasil, desde a invasão holandesa até o período da ditadura militar, contada em uma pequena comunidade na ilha de Itaparica.

 Há partes do Recôncavo em que as almas jovens desencarnadas sem aviso cedem a um primeiro impulso e por engano entram na barriga de uma cabra ou jega ou num ovo de galinha. Uma vez entradas, não podem sair até que nasça, se crie e morra ou seja matado o animal em que entraram, razão porque há quem venha ao mundo preferindo inanição a comer das carnes de certos bichos, isto porque já encarnaram nesses bichos uma ou várias vezes e os conhecem por dentro, não cessando jamais de ser parentes. Existe a possibilidade de que se proceda a extração de uma alma assim vitimada pela inexperiência, mas isto requer poderes acima de humanos e uma conjunção de fatores mais que delicada, de maneira que a maioria das famílias afligidas pela presença de uma alma encarnada em um de seus animais prefere agir com resignação e caridade.

Resumo da obra

Viva o Povo Brasileiro, João Ubaldo Ribeiro

Fonte: Reprodução

Viva o Povo Brasileiro é um romance histórico, escrito por João Ubaldo Ribeiro, em 1984. O enredo se situa entre 1647, com a chegada dos holandeses à Bahia, até o ano de 1977, período correspondente à Ditadura Militar.

Diferentemente de outros romances, não temos um personagem central, mas muitos. Boa parte da narrativa acontece na ilha de Itaparica, na Bahia, onde nasceu Maria da Fé, uma das primeiras personagens importantes do livro. Maria aparece no enterro do avô vestida de capitão, em um desafio escancarado ao exército. É Maria também quem funda a Irmandade do Povo Brasileiro, com o intuito de equilibrar a cruel balança de poder.

A narrativa inicia com a morte do alferes Brandão Galvão, informando que este morre ainda jovem, sem ter constituído família tampouco realizado nada marcante. Ainda que retratado em uma pintura como mártir, aos moldes de Francisco de Assis, Brandão é apenas um pescador e seu título militar é dado pelos seus colegas de reuniões políticas. Esse contraste entre o real e a versão valorizada do relato será recurso constante ao longo de todo o romance.

A divergência de histórias também se faz presente com outro personagem desse período: o Barão de Pirapuama, Perilo Ambrósio Góes Farinha. Ambrósio construiu para si uma narrativa heroica, na qual ele (português) se alia à causa brasileira, no episódio da Independência, por patriotismo.

Entretanto, o que ele deseja é tomar o patrimônio de sua família portuguesa. Isso porque o pai lhe impôs severos castigos após ele ter ferido a irmã com um espeto de carne, na intenção de tomar a refeição dela. Para sustentar a farsa de ser um grande guerreiro, ele mata o escravo Inocêncio e espalha sangue pelo próprio corpo. Além disso, para evitar ser denunciado, corta a língua de um segundo escravizado, o Feliciano.

A história segue com os descendentes de Vevé, escrava que Perilo Ambrósio violentou. Em sua jornada, os caboclos são auxiliados pelos orixás, com a intercessão de Inácia, advinha que alerta sobre um homicídio no futuro. Nesse ínterim, Júlio Dandão, Zé Pinho e Budião, fundam a Irmandade da Casa da Farinha, para trazer justiça à população escravizada.

Vevé dá luz à Maria da Fé, ou Dafé, que mata seu irmão bastardo, dando início a sua jornada heroica. Dafé é adotada como neta por Nego Leléu, um escravo liberto que tenta ganhar a vida com dignidade. Os valores de seu avô inspiram e moldam o caráter dela.

Perilo Ambrósio encontra um rival capaz de superá-lo quando o assunto é fraude. Seu guarda-livros, o mulato Amleto, passa a desviar parte da fortuna do barão. Assim, seu armazém começa a acumular mercadorias desviadas de Ambrósio, fazendo Amleto enriquecer, ao passo que a fortuna do barão míngua, fazendo-o morrer na pobreza.

Amleto consola a viúva empobrecida do antigo patrão e se mostra como um comerciante bem-sucedido, e um homem generoso e cheio de piedade. Além disso, forja documentos para fabricar uma ascendência nobre, apagando, perante a sociedade, sua herança racial africana. Muda o nome para Henrique Nobre Ferreira-Dutton.

Não existe, na narrativa, muita distinção entre a paródia e a verdade, sobretudo quando falamos das camadas mais baixas da sociedade. Podemos ver isso quando nos deparamos com a Irmandade. Não sabemos o que é a Irmandade do Povo Brasileiro, apenas sua missão. Quando Dandão explica sobre ela aos companheiros, o que segue é um relato que beira ao sobrenatural, mostrando o homem como um ser quase divino, detentor de segredos fabulosos.

Seguindo a história, encontramos Patrício Macário, o filho caçula de Amleto. Este segue um caminho contrário ao do pai, que teve sua ascensão forjada em mentiras e subterfúgios. Patrício integra-se à Irmandade, carregando o legado da mesma. Antes disso, já era um contestador, por ter nascido com características mestiças mais exacerbadas que do seu pai. Amleto, para puni-lo, envia-o ao exército. Lá, Patrício ascende à patente de general.

Voltando à Itaparica, Patrício e Maria da Fé se apaixonam de uma forma quase mística. A falta de desenvolvimento do romance entre os dois é proposital, para enfatizar que estão cumprindo uma divinação feita por Zé Popó, cujo corpo estava tomado pelo caboclo Sinique. Ambos se guiam por uma vontade superior e se mudam em definitivo para a ilha.

Patrício se dedica à magia da canastra e à vida com Dafé. Quando completa cem anos, é homenageado e se encontra, por meio de uma viagem mística, intermediada por Rita Popó, com o filho Lourenço. Por meio dessa revelação, nos é dito que Dafé teria morrido e, talvez o próprio Patrício, já que o texto não nos deixa isso claro.

A história dá um salto para o mesmo 29 de fevereiro, mas em 1896, em Arraial de Santo Inácio, onde encontramos outro personagem: o cego Faustino. Faustino estava rumando a Canudos, mas resolve narrar toda a história da humanidade para a plateia presente. A história começa desde a criação do mundo, passando pelo descobrimento do Brasil e termina por chegar na figura de Dafé. Faustino condensa toda a narrativa do livro em oito páginas, atestando que Maria da Fé e sua Irmandade já eram, de fato, lendas.

Faustino, muito afeito a condensar as mensagens, condensa a própria mensagem do livro. A de que a verdadeira história não é aquela que os poderosos pagam e matam para registrar no papel de forma fraudulenta, atendendo apenas aos interesses de poucos. A verdade era aquela falada por todos, construída com a ajuda de todos, pessoa a pessoa, nunca estando completa.

A história não apresenta um final, pois não tem um tronco narrativo bem definido, a ideia é convidar o leitor a fazer parte da narrativa, construindo novas histórias também.

O holandês aprovou, baixando e levantando a cabeça com toda a força. O caboco riu mais aberto e passou a indicar um e outro ritmadamente. Aquimã, Sinique, Aquimã, Sinique, Aquimã-Aquimã, Sinique-Sinique. O holandês também riu, as mulheres e as meninas riram, quase cantaram uma cantiga: Aquimã, Sinique — hum-hum — Sinique, Aquimã — hum-hum, aquimansinique! Ai, fez o caboco, enxugando uma lágrima de riso no canto do olho, ai-ai. Quase começava de novo a toada, tinha até imaginado algumas variações e o clima de festa lhe agradava, mas já estava ficando tarde e este mundo não é só para a diversão. Ficou sério e disse “quietaí, vá deitchá” ao preso, embora sem muita convicção, porque sabia que, como os outros de sua espécie, era um bicho bronco, que não entendia as ordens mais simples. Virou-lhe as costas resignado com a barulheira que recomeçara, levou Aquimã ao cepo, pôs-lhe o pé na cara com firmeza mas sem brutalidade e o sangrou pelo pescoço numa cuia de cabaceira com caldinho de limão da terra dentro, havendo preferido isto a achatar a cabeça, para não estragar muito a mioleira.

Estrutura da obra

O livro possui quase 700 páginas, a depender da edição, e é dividido em 20 capítulos, entrecortados por cabeçalhos que estipulam data e local onde aquele pedaço da história será narrado, um recurso comumente utilizado pelos romances históricos.

A narrativa está repleta de saltos temporais e, embora se trate de um romance histórico, os personagens e as tramas narradas são fictícios, o que não só possibilita explorar novas perspectivas como torna o livro singular.

Contexto histórico

Viva o Povo Brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro, percorre quatro séculos da história do Brasil, relatando episódios que iniciam com a invasão holandesa, seguindo pela Independência do Brasil, Guerra dos Farrapos, Guerra do Paraguai, Abolição da Escravatura, Proclamação da República, Guerra de Canudos, Ditadura Vargas e Ditadura Militar Brasileira.

Foco narrativo, narrador e linguagem

Focado na construção de uma narrativa baseada na história do Brasil, o autor usa como recurso um narrador heterodiegético (onisciente e observador), que revela todos os detalhes das personagens e dos contextos históricos pelos quais a narrativa percorre.

A linguagem da narrativa é bem estruturada em relação à utilização do português prescrito na norma culta. Entretanto, há variações linguísticas, vocábulos e expressões típicas dos períodos mencionados na narrativa. Isso é notado, principalmente, nos diálogos dos personagens que, em certos momentos, usam gírias, marcas de oralidade e expressões regionalistas de cada época.

Tempo e espaço

Tratando-se de um romance histórico, narrando muitos períodos e ambientes, o tempo e o espaço da obra são diversos. A cronologia geral vai de 1647 a 1977 e a distribuição das datas é feita de forma irregular, algumas lembradas em flashbacks.

Relevância da obra

Viva o Povo Brasileiro possui grande relevância cultural e literária, isso porque o autor conseguiu reconstruir a história do Brasil, muito bem respaldada no contexto histórico, de forma satírica.

A obra faz com que os personagens da história, reais e fictícios, e os acontecimentos históricos, exatos ou fantasiados, representem a construção e unicidade da identidade nacional. Além de apresentar todos os elementos responsáveis, sejam bons ou maus, por edificar as estruturas históricas, culturais e morais do país e influenciar os caminhos para o futuro.

Exibindo novas perspectivas, Ubaldo Ribeiro modifica fatos históricos e possibilita aos leitores refletir acerca de diversos problemas sociais, políticos e econômicos.

Nem mesmo isso conseguia agora, chorando a mais não poder apoiado no tronco espinhento do dendezeiro coberto de ervas trepadeiras, queria sua meninazinha de volta, para que queria dinheiro, para que queria qualquer coisa, se não era mais Vô Leléu, se não tinha mais nada para aprender no mundo, se fracassara na única coisa de sua vida que não encarara como trabalho mas como vida mesmo? Pela primeira vez, Nego Leléu pensou em morrer, imaginou que também precisava descansar, que a morte era uma coisa necessária e misericordiosa, que virar nada era melhor que ser o que lá fosse, pois o sofrimento nele era o de sempre, era trabalho, mas o sofrimento nela não se podia suportar, matava mais que a própria morte. […] Fechando as mãos até as unhas se enterrarem nas palmas, teve grande pena de si mesmo, vontade de ter alguém com quem se queixar, vontade de ter pai, mãe, amigos do peito, sentiu-se tão só que viu de perto a loucura, viu como seria fácil perder a razão, como era uma coisa tão simples quanto atirar-se de uma penha para a escuridão do abismo.

Notas sobre o autor

João Ubaldo Osório Pimentel Ribeiro nasceu em 23 de janeiro de 1941, na Ilha de Itaparica, localizada na Bahia. Foi um romancista, cronista, jornalista, professor e tradutor brasileiro, além de membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), tendo ocupado a cadeira número 34.

Ganhou diversos prêmios literários, inclusive dois dos mais importantes prêmios da literatura brasileira: o Prêmio Camões, em 2008, e o Jabuti, em 1984. Entre as obras de destaque, além da analisada aqui, estão: Sargento Getúlio, O Sorriso do Lagarto, A Casa dos Budas Ditosos e O Albatroz Azul.

Viva o Povo Brasileiro fez tanto sucesso que ganhou uma adaptação na TV brasileira, por meio de uma minissérie produzida e exibida pela TV Globo, em 1990. João Ubaldo Ribeiro faleceu em 18 de julho de 2014, na cidade do Rio de Janeiro, devido a problemas causados por uma embolia pulmonar.

A herança literária de João Ubaldo Ribeiro para a literatura brasileira é enorme e está permeada por obras de essência mítica, que tratam o cotidiano do povo brasileiro, com discussões que levam à reflexão sobre diversos aspectos políticos e sociais.

Deixou que uma lágrima lhe escorresse livremente de cada olho, deu um empurrão no lenço que uma mão solícita lhe levou ao rosto e disse, a voz tão baixinha que quase ninguém escutou, que não estava pretendendo que alguma coisa acontecesse por causa do que falara ou falasse. Não pretendia que acontecesse nada, não previa nada, apenas testemunhava e era um testemunho a que dariam fé ou não, mas era um testemunho. Não podia morrer sem contar que sabia com certeza de uma coisa, a qual, por sua vez, lhe dava certeza de uma segunda coisa — que o povo pensa, que o povo pulsa, que o povo tem uma cabeça que transcende as cabeças dos indivíduos, que não poderá ser exterminado, mesmo que façam tudo para isso, como fazem e farão. E a primeira coisa de que tinha certeza era a respeito do Espírito do Homem.

Já refletiu sobre os aspectos que marcam nossa identidade nacional? Comente o que achou do livro de João Ubaldo Ribeiro!

No Canal do Ensino, leia também:

Boa leitura e até a próxima!

Deixe um comentário

© 2012-2019 Canal do Ensino | Guia de Educação

Voltar para o topo