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Resumo de livro: Sagarana, de João Guimarães Rosa

Olá, leitor!

Publicado em 1946, Sagarana, de João Guimarães Rosa, é a obra-prima do autor em sua produção de contos. Traz características do Realismo Regionalista Fantástico, que promoveu uma renovação na literatura modernista brasileira, principalmente em questões relativas ao aproveitamento da linguagem e da oralidade local.

Os aspectos da experimentação linguística, que são típicos do autor, podem ser vistos no próprio título do livro. Saga é um radical de origem germânica que significa “canto heroico”, enquanto Rana é uma expressão de língua indígena brasileira e significa “à maneira de”.

A obra possui  9 contos, que podem também ser considerados novelas, devido à extensão e à complexidade. As histórias retratam de forma sublime a vida dos sertanejos que habitam o norte de Minas Gerais.

A grandeza dos contos de Rosa é produto da rica construção dos personagens, todos com seus medos e anseios permeados pela singularidade da existência humana. Esses sentimentos são traduzidos por meio de narrativas nas quais os protagonistas vencem os desafios da vida e acabam se perpetuando como heróis ou mitos do Sertão. A misticidade, a espiritualidade, as crenças e o folclore do povo mineiro sempre aparecem nessas histórias e se misturam com o regionalismo fantástico.

O desenrolar dos contos aborda várias temáticas. Contudo, nunca abandona questões universais sobre a existência em todas as suas variadas concepções, passando, inclusive, por um sentido de moralidade para construir fábulas modernas.

…Altos são os montes da Transmantiqueira, belos os seus rios, calmos os seus vales; e boa é a sua gente… Mas, homens são os homens; e a paciência serve para vãos andares, em meados de maio ou no final de agosto. Garruchas há que sozinhas disparam. E é muito fácil arranjar-se uma cruz para as sepulturas de beira de estrada, porque a bananeira-do-campo tem os galhos horizontais, em ângulos retos com o tronco, simétricos, se continuando dos lados, e é só ir cortando, todos, com exclusão de dois. E… quê? O tatu-peba não desenterra os mortos? Claro que não. Quem esvazia as covas é o tatu-rabo-mole. O outro, para que iria ele precisar disso, se já vem do fundo do chão, em galerias sinuosas de bom subterrâneo? Come tudo lá mesmo, e vai arrastando ossadas para longe, enquanto prolonga seu caminho torto, de cuidoso sapador.

Estrutura da obra

Sagarana, João Guimarães Rosa

Fonte: Reprodução

Sagarana possui cerca de 400 páginas, mas isso pode variar de acordo com a edição, divididas em 9 contos/novelas:

  1. O Burrinho Pedrês – narrado em terceira pessoa;
  2. A Volta do Marido Pródigo –  narrado em terceira pessoa;
  3. Sarapalha –  narrado em terceira pessoa;
  4. Duelo –  narrado em terceira pessoa;
  5. Minha Gente –  narrado em primeira pessoa;
  6. São Marcos – narrado em primeira pessoa;
  7. Corpo Fechado –  narrado em terceira pessoa;
  8. Conversa de Bois –  narrado em terceira pessoa;
  9. A Hora e a Vez de Augusto Matraga –  narrado em terceira pessoa.

Resumo da obra

Por se tratar de uma coletânea de contos, faremos um breve resumo sobre cada um deles:

1. O Burrinho pedrês

Nesse conto, o fazendeiro Major Saulo manda que seus homens levem uma boa quantidade de bois para a comercialização numa cidade distante, convocando seus vaqueiros mais experientes para a tarefa, que possuem cavalos fortes e saudáveis. Contudo, acompanha a condução da boiada um velho e fraco burrinho chamado Sete-de-Ouros, que carrega alguns poucos objetos.

Na ida, os vaqueiros atravessam um pequeno riacho, que, na volta, após uma chuva pesada, torna-se um rio caudaloso extremamente perigoso. Assim, durante a travessia, eles percebem que o único a conseguir vencer a correnteza do rio é o velho e fraco burrinho, que, devido à sua experiência, sabe que a melhor forma de passar é utilizando a própria força das águas a seu favor, sem lutar contra elas.

2. A Volta do Marido Pródigo

Lalino Salãthiel é casado com Maria Rita, que vive no interior de Minas Gerais. Desejando ter uma vida de aventuras na cidade do Rio de Janeiro, ele abandona a mulher e parte para terras cariocas com o dinheiro que consegue juntar com seu trabalho e com a venda de alguns bens. Entretanto, após gastar todo o dinheiro, Lalino retorna para sua terra e encontra Maria Rita envolvida com um espanhol, o Ramiro.

Desejando então recuperar sua vida, bem como sua esposa, ele entra para as disputas políticas locais e elege seu candidato, que expulsa os estrangeiros da região. Assim, com Ramiro fora de cena, Lalino consegue fazer com que Maria Rita o perdoe.

3. Sarapalha

Ribeiro e Argemiro são primos que vivem isolados no norte de Minas Gerais, num lugar chamado Sarapalha. Como companhia, possuem apenas o cachorro Jiló, pois sofrem de malária, que provoca febre e tremedeira em ambos. Ribeiro gosta da companhia do primo, principalmente porque ainda sofre pelo abandono de sua esposa, que fugiu com outro homem.

A cumplicidade dos primos é abalada após Argemiro confessar a Ribeiro que também amava sua esposa, mesmo sem ter demonstrado os seus sentimentos. Contudo, isso faz com que Ribeiro o expulse de suas terras por considerar aquilo uma traição.

4. Duelo

Após uma pescaria malsucedida, que faz com que Turíbio retorne para casa mais cedo, ele vê sua mulher, Silvana, traindo-o com o militar Cassiano Gomes. Turíbio decide se vingar e desafia Cassiano para um duelo, mas o militar foge. Contudo, Turíbio adia sua vingança por alguns dias e acaba por matar o homem errado, que, na verdade, era o irmão de Cassiano.

Temeroso, Turíbio foge para São Paulo. Devido a problemas cardíacos, Cassiano, por sua vez, vê-se obrigado a se hospedar na casa de um homem simples, Timpim Vinte-e-Um. Depois de um tempo, Cassiano acaba por falecer. Sabendo disso, Turíbio decide voltar para Minas Gerais, entretanto, é surpreendido logo em sua chegada, sendo morto por Timpim, que realizou o pedido de vingança de Cassiano em seu leito de morte.

5. Minha Gente

O conto narra a história de um inspetor escolar que vai passar as férias na fazendo de seu tio, no interior de Minhas Gerais. Lá, ele encontra Maria Irma, uma prima que tinha sido sua namorada na infância e, assim, ambos retomam a aventura amorosa da juventude. Contudo, Maria Irma faz com que o primo/amante fique interessado por Armanda, uma amiga que está comprometida com um tal de Ramiro, que, por sua vez, é a verdadeira pretensão amorosa de Maria Irma.

Nesse contexto, o rapaz utiliza estratagemas de xadrez, jogo que adorava, no jogo do amor. Depois de muitos acontecimentos, a história termina com um casamento duplo, com o inspetor se casando com Armanda e Maria Irma se casando com Ramiro.

6. São Marcos

Izé, personagem e narrador do conto, não liga muito para as crendices populares, sendo até mesmo debochado e zombeteiro. Por isso, sempre que podia, ele ia para a casa de João Mangolô, tido como feiticeiro da região, para lhe atirar insultos e injúrias. Durante um passeio, Izê acaba por ficar cego de uma hora para a outra, sem explicações aparentes.

Não encontrando soluções, decide fazer a oração de São Marcos, que tem fama de ser poderosa, e consegue se guiar pela audição e pelo olfato até a casa do feiticeiro. Chegando lá, João Mangolô retira a venda de um boneco, fazendo Izê voltar a enxergar. Depois desse episódio, Izê se despede do feiticeiro com respeito e parte para seguir a sua vida, só que agora mais crédulo.

7. Corpo Fechado

Manuel Fulô vive no vilarejo de Laginha, tendo somente 2 paixões em sua vida: a primeira, sua noiva, Das Dores; a segunda, uma mula de estimação chamada Beija-Fulô. Antonico das Pedras, um feiticeiro local, cobiça a mulinha de ManuelTargino, um valentão, por sua vez, cobiça a noiva e diz que deseja dormir com ela antes dela se casar. Assim, Manuel tem que impedir que isso aconteça e enfrentar o valentão.

O médico local, amigo de Manuel, que também é o narrador dessa história, não encontra maneiras de ajudar. Então, o noivo, desesperado, recorre ao feiticeiro, que fecha seu corpo em troca da mula Beija-Fulô. Com o corpo fechado, Manuel segue para um duelo com Targino, matando o seu inimigo e se tornando o valentão do lugar.

8. Conversa de Bois

Tiãozinho é um menino que vive um drama em sua vida: seu pai está doente e não pode fazer nada contra os amores que a esposa mantém com um dos seus funcionários, o condutor dos carros de boi, chamado Agenor. Quando o pai de Tiãozinho morre, o menino ajuda a transportar o corpo até o cemitério mais próximo. Durante o caminho, Agenor explica para o menino que seria seu padrasto e mandaria nele.

Contudo, Agenor conduz os carros de boi da mesma forma que fala, com rispidez e crueldade. Os bois, por sua vez, conversam entre si sobre matar o condutor. Quando Agenor tira um cochilo, os bois colocam o plano em prática e começam a sacudir o carro, fazendo Agenor cair e ser atropelado pelas rodas traseiras.

9. A Hora e a Vez de Augusto Matraga

Augusto Matraga é um fazendeiro bruto com um comportamento violento. Maltrata sua esposa, Dionóra, despreza sua filha e é cruel com as pessoas. Além disso, gasta dinheiro freneticamente com jogos e outros vícios, desrespeita seus funcionários e resolve tudo na bala com a ajuda do seu bando de capangas.

A história muda quando Dionóra foge com outro homem e os empregados vão embora. Augusto Matraga vai tirar satisfação com eles, o que acaba numa briga na qual ele é espancado, cai de um barranco e é dado como morto. Contudo, é encontrado por um casal que mora num lugarejo afastado, que cuida dele e o ajuda a sobreviver.

Enquanto se recupera, Augusto reflete sobre tudo o que fez, decidindo viver uma vida de penitência a partir de então. Após a recuperação, parte para uma pequena propriedade que possui no Tombador, lugar distante, passando a viver com humildade, sempre a trabalhar arduamente. Um dia, aparece um cangaceiro conhecido como Joãozinho Bem-Bem, que conta sobre seus feitos e simpatiza com Augusto, que o recebe em sua propriedade.

Quando decide partir, Bem-Bem convida Augusto para fazer parte do seu bando, mas ele recusa. Depois de certo tempo, Augusto segue pela estrada sem rumo e acaba por parar em uma cidadezinha, onde se instala e começa a ajudar as pessoas do local com o seu trabalho.

Pouco tempo depois, Joãozinho Bem-Bem e seu bando de cangaceiros aparecem por lá com a intenção de roubar a cidadezinha e vingar a morte de um companheiro, pois o assassino possuía família lá.

Augusto percebe que chegou a vez, então, decide proteger um homem velho e sua família, que seriam assassinados por Bem-Bem, e entra em confronto com os cangaceiros. O conflito termina quando Bem-BemAugusto falecem durante a briga.

Matraga não é Matraga, não é nada. Matraga é Esteves. Augusto Esteves, filho do Coronel Afonsão Esteves, das Pindaíbas e do Saco-da-Embira. Ou Nhô Augusto – o homem – nessa noitinha de novena, num leilão de atrás da igreja, no arraial da Virgem Nossa Senhora das Dores do Córrego do Murici. Augusto aparece como homem desregrado. Fazia questão de mostrar-se valentão, não se importando com a família – a mulher Dionóra e a filha. Gostava de tirar mulher dos outros, de brigar, de debochar. Vivia cercado de capangas. Com a morte do pai Afonsão, ficou ainda mais estouvado e sem regras: tinha dívidas enormes, faltava-lhe crédito, terras em desmando e política do lado errado.

Notas sobre o autor

João Guimarães Rosa é considerado um dos grandes mestres da literatura brasileira, estando ao lado de Machado de Assis como um dos melhores escritores do Brasil. Um dos maiores representantes da terceira fase do Modernismo, inaugurou essa escola literária com Clarice Lispector e João Cabral de Melo Neto. Foi responsável por resgatar o regionalismo, a cultura popular, o trabalho com a linguagem e o experimentalismo em uma literatura de caráter universal.

Contexto histórico

Após o término da ditadura Vargas, em 1945, as diferentes produções culturais brasileiras utilizaram-se das mais variadas formas de experimentação nos processos criativos. Sendo assim, o contexto histórico se caracteriza como esse período de renovação da cultura e da literatura, inaugurando a terceira fase do Modernismo no Brasil.

Tempo e espaço

Todas as histórias se passam no começo do século XX, mas não são mencionadas datas específicas. Quanto ao espaço, todas as narrativas se passam em Minas Gerais, sempre com referência ao Sertão, principalmente no norte do estado, com menções a alguns lugares, cidadezinhas e vilarejos, inventados ou não.

Narrador, foco narrativo e linguagem

As histórias narradas em terceira pessoa predominam (narrador heterodiegético), sendo que apenas 2 são narradas em primeira pessoa, Minha Gente (narrador autodiegético) e Corpo Fechado (narrador homodiegético, que participa da história, mas não é o personagem principal).

A linguagem utilizada não está ligada apenas ao aspecto regionalista, com expressões dos dialetos sertanejos, mas, também, a questões acerca dos neologismos e arcaísmos.

Relevância do livro

Sagarana possui uma grande importância para a literatura brasileira por ter inaugurado a terceira fase do Modernismo. É umas das obras-primas da prosa modernista regionalista, inovando na linguagem e usando o Sertão como pano de fundo para abordar temas universais, como amor e morte. Os contos sempre trazem questões inerentes à condição humana, englobando inúmeras reflexões sobre a existência.

Alguém que ainda pelejava, já na penúltima ânsia e farto de beber água sem copo, pôde alcançar um objeto encordoado que se movia. E aquele um aconteceu ser Francolim Ferreira, e a coisa movente era o rabo do burrinho pedrês. E Sete-de-Ouros, sem susto a mais, sem hora marcada, soube que ali era o ponto de se entregar, confiado, ao querer da correnteza. Pouco fazia que esta o levasse de viagem, muito para baixo do lugar da travessia. Deixou- se, tomando tragos de ar. Não resistia. Badú resmungava más palavras, sem saber que Francolim se vinha aguentando atrás, firme na cauda do burro. Aí, nesse meio-tempo, três pernadas pachorrentas e um fio propício de corredeira levaram Sete-de-Ouros ao barranco de lá, agora reduzido a margem baixa, e ele tomou terra e foi trotando. Quando estacou, sim, que não havia um dedo de água debaixo dos seus cascos. E, ao fazer alto, despediu um mole meio-coice. Francolim — a pé, safo.

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