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Angústia, de Graciliano Ramos

Olá, leitor!

A obra Angústia, de Graciliano Ramos, foi publicada em 1936, época em que o autor estava preso por causa de sua oposição ao governo de Getúlio Vargas. Angústia é um romance muito renomado, sendo um dos livros mais importantes da literatura brasileira.

Ganhador do Prêmio Lima Barreto, concedido pela Revista Acadêmica, Graciliano Ramos foi um dos maiores escritores de seu tempo, trazendo simbologias referentes à situação social e política da época e aos dramas da condição humana.

A crise econômica e social que o Brasil enfrentava na década de 1930 pode ser notada nas mudanças entre as gerações da família Trajano, que começa com um senhor de terras poderoso, passa pela vida de seu filho, Camilo, e chega a Luís da Silva, que é o narrador e protagonista da história.

Levantei-me há cerca de trinta dias, mas julgo que ainda não me restabeleci completamente. Das visões que me perseguiam naquelas noites compridas umas sombras permanecem, sombras que se misturam à realidade e me produzem calafrios. 

Há criaturas que não suporto. Os vagabundos, por exemplo. Parece-me que eles cresceram muito, e, aproximando-se de mim, não vão gemer peditórios: vão gritar, exigir, tomar-me qualquer coisa.

Certos lugares que me davam prazer tornaram-se odiosos. Passo diante de uma livraria, olho com desgosto as vitrinas, tenho a impressão de que se acham ali pessoas, exibindo títulos e preços nos rostos, vendendo-se. É uma espécie de prostituição. Um sujeito chega, atenta, encolhendo os ombros ou estirando o beiço, naqueles desconhecidos que se amontoam por detrás do vidro. Outro larga uma opinião à-toa. Basbaques escutam, saem. E os autores, resignados, mostram as letras e os algarismos, oferecendo-se como as mulheres da Rua da Lama.

Vivo agitado, cheio de terrores, uma tremura nas mãos, que emagreceram. As mãos já não são minhas: são mãos de velho, fracas e inúteis. As escoriações das palmas cicatrizaram.

Resumo da obra

Angústia, Graciliano Ramos

Fonte: Reprodução

O conflito da história acontece devido ao triângulo amoroso entre Marina, Luís da Silva e Julião Tavares.  A partir dessas relações, outras discussões são levantadas, como as questões sociais e políticas que perpassam toda a obra.

Julião Tavares, sendo rico, conquistou Marina rapidamente, moça que era noiva de Luís da Silva. Isso remete aos pensamentos sobre o quanto as pessoas podem ser materialistas e volúveis, temática muito utilizada por Graciliano Ramos em seus livros.

Dentro do enredo, também há uma competição entre Luís e Julião. Julião nasceu em um berço de ouro e usa seu dinheiro e posição social para conquistar as mulheres. Já Luís vive de favor na casa dos outros, chega a pedir esmolas, se torna funcionário público e está cheio de dívidas, além de ser desprezado por sua noiva, Marina.

Luís nunca teve regalias. Contudo, viu sua vida mudar quando passou em um concurso, começou a trabalhar na Diretoria do Tesouro Público de Maceió e a escrever artigos encomendados por veículos de comunicação da cidade.

Mesmo com essas melhorias, a situação continuava difícil, já que o salário de Luís era baixo e as dívidas eram muitas. O personagem se apaixona por Marina, eles começam um relacionamento e ficam noivos. Entretanto, a condição financeira do rapaz se complica, uma vez que ele tem que cuidar dos preparativos do casamento.

Diante desse contexto, Luís se torna amargurado e ressentido, atormentado pelas lembranças de seu passado triste e miserável. Aproveitando-se da situação, Julião Tavares, homem rico e simpático, conquista Marina, a amada de Luís.

Marina se envolve com Tavares, encantada pela vida que poderia ter ao lado de um homem rico, e desmancha seu noivado com o Luís sem lhe dar qualquer explicação razoável. Assim, os sentimentos de vingança e decepção só aumentam no coração do jovem traído.

Marina foi apenas usada como um objeto de desejo e foi abandonada grávida, enquanto Julião Tavares já se relacionava com outra mulher. Luís, por uma questão de honra, começa a planejar minunciosamente morte de Tavares. Um dia, Luís o enforca e modifica a cena do crime para parecer um suicídio.

O próprio assassino confessa e narra detalhadamente o acontecido. Luís matou Tavares não só por causa de Marina, mas também por representar tudo que ele não poderia ser. Por isso, esse ato foi encarado como uma libertação não apenas do rival, mas também das decepções acumuladas durante a sua vida.

Fumo. Assisto a uma discussão do barbeiro André Laerte com o negociante Filipe Benigno. As palavras me chegam quase apagadas, destituídas de senso. É provável que não digam nada. Filipe Benigno é um pouco nebuloso: só percebo dele claramente as barbas brancas e os olhos miúdos. Mas a figura de André Laerte tem bastante nitidez. Parece um gato: anda em redor do outro como se estivesse preparando um salto para agarrá-lo. Tem um avental manchado de sangue, um bigodinho ralo e faz “Pfu!” Seu Batista, vestido em robe-de-chambre, passeia na calçada, com as mãos atrás das costas. D. Conceição, mulher de Teotoninho Sabiá, prepara milho para o xerém. Carcará solta gargalhadas que se ouvem na outra extremidade da rua. O doutor juiz de direito conta ao vigário histórias de onças e jacarés do Amazonas. Cabo José da Luz, à porta do quartel, espalha tristezas: 

Assentei praça. Na polícia eu vivo

Por ser amigo da distinta farda…

O sino da igrejinha bate a primeira pancada das ave-marias.

Análise dos principais personagens

Os principais personagens de Angústia são:

  • Luís da Silva – funcionário público de 35 anos, inconformado com as condições precárias nas quais ele e as pessoas do seu meio vivem. É inteligente, mas rude e amargurado pela vida difícil, na qual têm origem suas preocupações sociais.
  • Marina – moça que representa muitas mulheres de sua época, carregada de futilidade e criada em um ambiente familiar de costumes rigorosos. Tem uma personalidade volúvel e se deixa levar pelo desejo de riqueza e conforto.  
  • Julião Tavares – homem rico que faz questão de demonstrar e se aproveitar de sua alta posição social.

Está aí uma história que narro com satisfação a Moisés. Ouve-me desatento. O que lhe interessa na minha terra é o sofrimento da multidão, a tragédia periódica das secas. Procuro recordar-me dos verões sertanejos, que duram anos. A lembrança chega misturada com episódios agarrados aqui e ali, em romances. Dificilmente poderia distinguir a realidade da ficção. De resto a dor dos flagelados naquele tempo não me fazia mossa. Penso em coisas percebidas vagamente: o gado, escuro de carrapatos, roendo a madeira do curral; o cavalo de fábrica, lazarento e com esparavões; bodes definhando na morrinha; o carro de bois apodrecendo; na catinga parda, manchas brancas de ossadas e voo negro dos urubus. Tento lembrar-me de uma dor humana. As leituras auxiliam-me, atiçam-me o sentimento. Mas a verdade é que o pessoal da nossa casa sofria pouco. Trajano Pereira de Aquino Cavalcante e Silva caducava; meu pai vivia preocupado com os doze pares de França; sinha Germana tinha morrido; Quitéria, coitada, era bruta demais e por isso insensível. Os outros moradores da fazenda, as criaturas que viviam em ranchos de palha construídos nas ribanceiras do Ipanema, não se queixavam. José Baía falava baixo e ria sempre. Sinha Terta rezava novenas e fazia partos pela vizinhança. Amaro vaqueiro alimentava-se, nas secas, com sementes de mucunã lavadas em sete águas, raiz de imbu, miolo de xiquexique, e de tempos a tempos furtava uma cabra no chiqueiro e atirava a culpa à suçuarana. Dores só as minhas, mas estas vieram depois.

A narrativa do livro

A obra é narrada em 1 ª pessoa, pelo próprio Luís da Silva, e se destaca pelos diálogos interiores do protagonista. Os sentimentos de Luís são tão envolventes que o leitor também fica angustiado com as situações vividas pelo personagem. A forma de narrar é estendida e achatada com a intenção de causar determinados efeitos, que são enriquecidos por uma linguagem cheia de coloquialismos nordestinos.

Sobre o autor

Graciliano Ramos nasceu em 1892, em Alagoas. Ele iniciou sua vida profissional como político, sendo prefeito de sua cidade, Palmeira dos Índios, entre 1928 e 1930.

Nessa época, ele foi incentivado pelo editor carioca Augusto Schmidt a publicar seu primeiro livro, “Caetés”. Contudo, a repercussão nacional veio com “Vidas secas”. Foram os textos concisos e ao mesmo tempo carregados de ironia e criticidade que atraíram a atenção dos leitores e colocaram Graciliano Ramos entre os grandes nomes da literatura brasileira.

Como certos acontecimentos insignificantes tomam vulto, perturbam a gente! Vamos andando sem nada ver. O mundo é empastado e nevoento. Súbito uma coisa entre mil nos desperta a atenção e nos acompanha. Não sei se com os outros se dá o mesmo. Comigo é assim. Caminho como um cego, não poderia dizer por que me desvio para aqui e para ali. Frequentemente não me desvio – e são choques que me deixam atordoado: o pau do andaime derruba-me o chapéu, faz-me calombo na testa; a calçada foge-me dos pés como se tivesse encolhido de chofre; o automóvel para bruscamente a alguns centímetros de mim, com um barulho de ferragem, um raspar violento de borracha na pedra e um berro do chofer. Entro na realidade cheio de vergonha, prometo corrigir-me. “Perdão! Perdão!” digo às pessoas que me abalroam porque não me afastei do caminho. As pessoas vão para os seus negócios, nem se voltam, e eu me considero um sujeito mal-educado. Tenho a impressão de que estou cercado de inimigos, e como caminho devagar, noto que os outros têm demasiada pressa em pisar-me os pés e bater-me nos calcanhares. Quanto mais me vejo rodeado mais me isolo e entristeço. Quero recolher-me, afastar-me daqueles estranhos que não compreendo, ouvir o Currupaco, ler, escrever. A multidão é hostil e terrível. Raramente percebo qualquer coisa que se relacione comigo: um rosto bilioso e faminto de trabalhador sem emprego, um cochicho de gente nova que deseja ir para a cama, um choro de criança perdida. Às vezes isso me perturba, tira-me o sono (…) penso nos namorados que se atracam junto a uma vitrina, em posição incômoda, no operário que tem fome e ameaça o patrão, na criança que chora perdida, chamando a mamãezinha.. Tudo foi visto ou ouvido de relance, talvez não tenha sido visto nem ouvido bem, mas avulta quando estou só – e distingo perfeitamente a criança, o operário faminto, os namorados que desejam deitar-se. Eles me invadiram por assim dizer violentamente. Não fiz nenhum esforço para observar o que passava na multidão, ia de cabeça baixa, dando encontrões a torto e a direito nos transeuntes. De repente um grito, uma palavra amarga, um suspiro – e algumas figuras se criaram, foram bulir comigo na cama.

Até a próxima!

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