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Resumo de obra: A Cartomante, de Machado de Assis

Olá, leitor(a)!

A Cartomante, de Machado de Assis, é um conto que foi publicado em 1884, no jornal Gazeta de Notícias, em circulação no Rio de Janeiro, e lançado novamente em 2 antologias: Várias Histórias e Contos – Uma Antologia.

Trata-se de uma narrativa com uma história crítica, irônica e com certos toques de humor, que reproduz com maestria todas as incoerências da condição humana e das relações interpessoais, sem deixar de lado detalhes que tornam seus personagens reais e críveis.

Nesse conto, Machado de Assis utiliza marcas da oralidade e da metalinguagem, colocando diversas conversas entre o narrador e os leitores para torná-los cúmplices do enredo. Em A Cartomante, a trama é baseada em um triângulo amoroso, temática comum na escrita machadiana.

Hamlet observa a Horácio que há mais cousas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia. Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma cartomante; a diferença é que o fazia por outras palavras.
— Ria, ria. Os homens são assim; não acreditam em nada. Pois saiba que fui, e que ela adivinhou o motivo da consulta, antes mesmo que eu lhe dissesse o que era. Apenas começou a botar as cartas, disse-me: “A senhora gosta de uma pessoa…” Confessei que sim, e então ela continuou a botar as cartas, combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você me esquecesse, mas que não era verdade…
— Errou! interrompeu Camilo, rindo.
— Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já lhe disse. Não ria de mim, não ria…

Resumo da obra

A Cartomante, Machado de Assis

Fonte: Reprodução

A narrativa começa apresentando o casal Vilela e Rita, sendo ele um advogado famoso na cidade do Rio de Janeiro e ela, uma esposa que segue os moldes impostos pela sociedade da época. Ainda no início do enredo, eles se encontram com Camilo, amigo de infância de Vilela que está passando por uma fase difícil após a morte de sua mãe e pede ajuda para lidar com o processo judicial que diz respeito ao inventário da herança.

Durante esse período, Rita se encanta por Camilo e começa a se aproximar dele. No início, o rapaz resiste às investidas; contudo, acaba cedendo e assim se inicia o triângulo amoroso da história. Depois de certo tempo de romance, ele começa a receber cartas anônimas que o acusavam de traição, adultério e falta de escrúpulos. Dessa forma, Camilo passa a desconfiar que Vilela descobriu o caso da esposa e está mandando os bilhetes.

Essa sensação faz com que Camilo comece a evitar o amigo e até Rita. Entretanto, mesmo com medo, não consegue reprimir os sentimentos amorosos pela moça e eles acabam se vendo mais uma vez. No encontro, Rita diz que também está preocupada com a situação e relata que passou a consultar periodicamente uma cartomante, que a tem aconselhado e ajudado a lidar com seus sentimentos.

A cartomante é apresentada como uma personagem misteriosa, que cria uma atmosfera de tensão ao afirmar que Rita seria muito feliz no amor. Camilo inicialmente debocha de sua amada, falando que não acredita nessas coisas. Em seguida, porém, ele recebe uma carta de Vilela, dizendo que precisava vê-lo com urgência, ainda naquele dia, mas sem especificar nem as razões, nem a pressa de tal visita.

Camilo, desesperado, segue para a casa do amigo pensando nas maiores atrocidades. Sua apreensão era tanta que, ao se lembrar da cartomante, decide consultar a vidente para saber qual era o assunto que Vilela queria discutir com ele.

Chegando lá, a mulher o recebe cordialmente, diz que já o esperava e que tem uma grande revelação para fazer. Assim, a cartomante afirma que Camilo pode ficar tranquilo, que não há nada de errado no convite de Vilela e que ele seria muito feliz no futuro, com uma vida cheia de amor e prosperidade.

Camilo então segue despreocupado para a casa do amigo, com a certeza de que ele e Rita ficariam juntos e teriam um futuro repleto de amor e felicidade. Assim que Camilo entra na casa, vê o corpo de Rita no chão. Em seguida, olha para o amigo e percebe o ódio estampado em seu rosto. Camilo fica paralisado, sem saber o que fazer, e acaba sendo morto por Vilela.

Uniram-se os três. Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe de Camilo, e nesse desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou do enterro, dos sufrágios e do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e ninguém o faria melhor.
Como daí chegaram ao amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar as horas ao lado dela, era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era mulher e bonita. Odor di femmina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para incorporá-lo em si próprio. Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios. Camilo ensinou-lhe as damas e o xadrez e jogavam às noites; — ela mal, — ele, para lhe ser agradável, pouco menos mal. Até aí as cousas. Agora a ação da pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez os dele, que os consultavam antes de o fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas. Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente e de Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele pôde ler no próprio coração, não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho.
Palavras vulgares; mas há vulgaridades sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira vez passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim são as cousas que o cercam.

Os contos de Machado de Assis

A Cartomante, de Machado de Assis, é um conto muito importante para a literatura brasileira, pois antecipa a visão objetiva e pessimista das pessoas e do mundo típica da escola realista, quebrando os estereótipos idealizados do Romantismo que predominavam na época.

Os contos de Machado de Assis são marcados pela complexidade psicológica dos personagens e por enredos imprevisíveis. A utilização de humor ácido, crítica social, malícia, hipocrisia, mentira, ingenuidade e ironia faz com que seus personagens se tornem mais humanos e reais. Entre os contos aclamados do autor, estão A Igreja do Diabo, A Causa Secreta, Missa do Galo, A Cartomante, O Alienista, Adão e Eva, O Espelho, Teoria do Medalhão, To be or not to be, A Carteira, O Caso da Vara, Uns Braços, Pai contra Mãe e Noite de Almirante.

No dia seguinte, estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela:
“Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora.” Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, advertiu que teria sido mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava matéria especial, e a letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou todas essas cousas com a notícia da véspera.
— Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora, — repetia ele com os olhos no papel.
Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e lacrimosa, Vilela indignado, pegando da pena e escrevendo o bilhete, certo de que ele acudiria, e esperando-o para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo: depois sorriu amarelo, e em todo caso repugnava-lhe a idéia de recuar, e foi andando. De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia achar algum recado de Rita, que lhe explicasse tudo. Não achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a idéia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser que Vilela conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente, apenas com um pretexto fútil, viria confirmar o resto.

O estilo machadiano

A Cartomante é um conto que revela as principais características do estilo de escrita de Machado de Assis. Isso é notado no uso constante de metáforas elaboradas, no comportamento imprevisível dos personagens, no valor filosófico de algumas passagens e na presença de ambiguidade e ironia.

Machado de Assis também utiliza muito a intertextualidade, citando trechos, títulos e autores de outras obras. Além disso, em suas narrativas, ele explora questões sobre a natureza do conhecimento, sempre tornando essa discussão fundamental para o desenrolar das histórias e para seus desfechos enfáticos, reflexivos e imprevisíveis.

A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as costas para a janela, de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas.
Enquanto as baralhava, rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo dos olhos. Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com grandes olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a mesa, e disse-lhe:
— Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto…
Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo.
— E quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma cousa ou não…
— A mim e a ela, explicou vivamente ele.
A cartomante não sorriu: disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas e baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os maços, uma, duas, três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela, curioso e ansioso.
— As cartas dizem-me…
Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo. Não obstante, era indispensável muita cautela: ferviam invejas e despeitos. Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza de Rita… Camilo estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na gaveta.
— A senhora restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a mão por cima da mesa e apertando a da cartomante.
Esta levantou-se, rindo.
— Vá, disse ela; vá, ragazzo innamorato…

Foco narrativo, narrador e linguagem

O foco narrativo é em 3ª pessoa do singular e o narrador é onisciente, heterodiegético, que não participa da trama, mas tem acesso aos pensamentos dos personagens. A utilização desse tipo de narrador é essencial para a obra, pois dinamiza a história, torna-a imprevisível  e prende o leitor, fazendo-o cúmplice dos acontecimentos. Já a linguagem é tipicamente machadiana: elaborada e trabalhada, de forma culta e precisa.

Tempo e espaço

O tempo da narrativa é linear, ou seja, a história se desenrola de forma cronológica. Já o recorte temporal do conto corresponde ao ano de 1869. O espaço é a cidade do Rio de Janeiro, sendo que existem 2 menções a locais conhecidos, que são a Rua dos Barbonos e a Rua da Guarda Velha.

Análise dos personagens

Apesar de a narrativa girar em torno de 4 protagonistas, que são Vilela, Camilo, Rita e a cartomante, há outros personagens que aparecem de forma indireta, mas acabam se tornando muito importantes para a história. Por exemplo, a mãe de Camilo; ela é apenas mencionada, porém sua morte é fundamental para a trama, pois faz com que Camilo se aproxime de Vilela e se envolva com Rita.

Outro personagem importante que age de forma indireta é o autor anônimo dos bilhetes acusadores, que é responsável por fazer com que o casal adúltero fique temeroso e consulte a vidente. Apesar de muitos dizerem que o autor era o próprio Vilela, que estava torturando o amigo e a esposa enquanto esperava o melhor momento para sua vingança, não existe nenhuma passagem no conto que realmente afirme isso.

Alguns ainda indicam a possibilidade desse autor anônimo ser a própria cartomante que, depois de obter de Rita todas as informações sobre o caso amoroso, decide enviar as ameaças a Camilo e contar sobre o relacionamento para Vilela. Contudo, isso também é apenas uma hipótese não confirmada e o autor dos bilhetes continua desconhecido.

Além disso, como características dos principais personagens, temos:

Rita

Rita é uma mulher de 30 anos, com postura de boa esposa, mas muito decidida e determinada. É caracterizada como uma dama formosa, de boca pequena, lábios finos e olhos cálidos. Ela é casada com Vilela, mas acaba tendo um caso com Camilo, amigo de infância do marido.

Vilela

Vilela é um homem de 29 anos, mas tem a aparência de alguém mais velho. É um advogado famoso no Rio de Janeiro e é casado com Rita. Reencontra o amigo de infância Camilo e o ajuda a lidar com a morte da mãe.

Camilo

Camilo tem 26 anos e trabalha como funcionário público. É  jovial, alegre e despreocupado. Não seguiu o desejo do pai, que queria que o filho se tornasse médico. Acaba se apaixonando por Rita, esposa de Vilela, seu amigo de infância.

A cartomante

A cartomante é uma mulher de 40 anos, morena, magra e italiana. É caracterizada como tendo grandes olhos envoltos em mistérios. Contudo, ao final da narrativa, percebe-se que ela era apenas uma charlatã, que dizia o que seus clientes queriam ouvir, enganando-os com falsas adivinhações e promessas para o futuro.

A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, longo, longo, interminável.
Daí a pouco chegou à casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e entrou. A casa estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra, e mal teve tempo de bater, a porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela.
— Desculpa, não pude vir mais cedo; que há?
Vilela não lhe respondeu; tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal, e foram para uma saleta interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror:: — ao fundo sobre o canapé, estava Rita morta e ensangüentada. Vilela pegou-o pela gola, e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão.

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Até a próxima!

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